Debatedores defendem nova mentalidade na política de enfrentamento à violência
Por Ricardo Garcia09/04/2024 22:15 | Atualizado há 1 semana
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O programa “Grandes Debates - Parlamento Protagonista”, que foi ao ar nesta terça-feira (09/04), pela TV Assembleia (canal 31.1) e rádio FM Assembleia (96,7 MHz), teve como foco a segurança pública e a ocupação de territórios em cidades brasileiras pelo crime organizado.
Para debater o assunto, a atração, apresentada pelo jornalista Rui Lima, recebeu o deputado estadual Renato Roseno (Psol); a mestre e doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), Jacqueline Sinhoretto; e a professora do Departamento de Segurança Pública do Instituto de Estudos Comparados de Administração de Conflitos (INEAC/UFF), Jacqueline Muniz.
Na avaliação de Renato Roseno, a atuação policial voltada exclusivamente para a ocupação de territórios, como uma forma de enfrentamento da violência, precisa ser repensada.
“O Estado precisa deixar de lado essa obsessão beligerante com as tropas de elite, com a ideia dos homens de preto. Não desconsidero a importância das tropas especiais e da sua necessidade para determinadas tarefas, mas a ideia de substituir o grosso do policiamento por tropas especiais não produz resultados mais positivos”, considerou o parlamentar.
Segundo ele, é necessário apostar em uma agenda de prevenção da violência, com mais inteligência. “A ideia das tropas especiais permeia todo o Nordeste brasileiro, inclusive o Ceará. Todo o investimento público, o gasto orçamentário com essa lógica beligerante, poderia ser direcionado para a efetivação de direitos sociais”, apontou.
Para o deputado, é fundamental conhecer qual a concepção norteadora do plano de segurança do Ceará. “Enquanto a ideia norteadora raiz for a ocupação militar dos territórios, simulando territórios em guerra, nós vamos legitimar a morte. E nós sabemos quem morre muito mais nesses lugares”, comentou.
Sobre a atuação das organizações criminosas no Ceará, Renato Roseno fez um paralelo com a situação de outros estados enfatizando que a lógica da exploração territorial é diferente do que acontece em São Paulo e no Rio de Janeiro, por exemplo.
“O fenômeno miliciano no Ceará é diferente do que acontece no Rio de Janeiro, porque aqui temos outra divisão socioeconômica. Temos antigas organizações locais que se fortaleceram pela lógica penitenciária, em que gangues locais se desenvolveram e passaram a ser organizações nacionais, entrando na cadeia da geopolítica nacional armada”, explicou o deputado, complementando que no Ceará, há o domínio de pequenos territórios por organizações, dificultando o acesso de políticas públicas.
Em sua participação, Jacqueline Muniz destacou que, diante do fortalecimento da atuação de grupos criminosos de poder, que regulam territórios, populações e mercados, sejam eles lícitos ou ilícitos, é necessário voltar o olhar para dentro das instituições de poder.
“Nós temos uma economia política do crime, em que braços do Estado tem funcionado como agências reguladoras desse crime, arrendando territórios. O crime subiu a rampa do poder e não é de agora. Precisamos lidar com o que é da segurança, com a capacidade de controle da ação policial. Precisamos olhar para as nossas estruturas”, assinalou a professora.
De acordo com ela, há uma luz no fim do túnel para a problemática, mas que precisa ser alcançada por diferentes atores. “Temos saídas que estão ao alcance das gestões municipais, de delegados, de chefes de polícia, de secretários de segurança, de autoridades públicas do Legislativo, Executivo e Judiciário, que dizem respeito à transparência, dispositivos de controle, regulação, prestação de contas”, enumerou.
Ainda para Jacqueline Muniz, é necessária uma mudança de mentalidade social em relação ao modo de encarar a atuação do crime organizado. “Tudo começa na informação, pois o que produz o medo é a desinformação. A produção do conhecimento e da informação é condição fundamental para reverter o medo de morrer. A insegurança é a síntese de todos os medos que um cidadão enfrenta”, pontuou.
POLITICAS DE MÉDIO E LONGO PRAZOS
Jacqueline Sinhoretto, por sua vez, refletiu sobre o que considera como uma ideia enviesada no debate sobre a violência no País. “A atuação do crime organizado é sentida nos territórios pobres. A violência da polícia acontece nos territórios pobres. Mas tudo isso não é fruto das relações sociais desenvolvidas nesses territórios”, opinou.
Segundo ela, o poder das milícias, por exemplo, é articulado junto com parcelas do poder público, pontuando que determinadas facções criminosas, redes do mercado de armas e drogas, não nascem nas regiões periféricas e nem têm as suas decisões tomadas nesses territórios. “As decisões de fora se impõem sobre esses territórios, fazendo com que essas pessoas convivam com os efeitos desses poderes ilegais”, ressaltou.
A doutora em Sociologia salientou que é preciso fortalecer linhas de trabalho capazes de provocar algum efeito no controle da violência no Brasil, como políticas de redução no acesso a armas de fogo, monitoramento de ações policiais, dentre outras.
“É importante pensarmos que uma operação policial tem um prazo para acontecer. Enquanto isso, existem políticas públicas de segurança de médio e longo prazo, que não necessariamente envolvem a atuação policial, que não estão sendo feitas. Nós precisamos dessas políticas de longo prazo, de valorização do direito de ir e vir do cidadão, que estão ficando em segundo plano”, lamentou Jacqueline Sinhoretto.
Coordenado pelo Conselho de Altos Estudos e Assuntos Estratégicos da Alece, o programa Grandes Debates também é transmitido pelas redes sociais da TV Assembleia e da rádio FM Assembleia.
Edição: Clara Guimarães
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