Comissão da Alece recebe Protocolo de Consulta Prévia do povo Tapuya-Kariri
Por Márcia Feitosa14/05/2024 18:48 | Atualizado há 11 meses
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A Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece) realizou uma audiência pública, nesta terça-feira (13/05), por meio da Comissão de Direitos Humanos, presidida pelo deputado Renato Roseno (Psol), para o recebimento do Protocolo de Consulta Prévia do Povo Tapuya-Kariri. O documento oficializa regras sobre a garantia de consulta sobre ações legislativas ou administrativas dos governos e empresários, que afetem o território.
O protocolo foi desenvolvido tendo como base a Aldeia Gameleira, localizada entre os municípios de São Benedito e Carnaubal, onde vivem 1.083 indígenas. A elaboração teve início em junho de 2023, apoiado pela Fundação Rosa Luxemburgo. Os saberes e vivências do povo foram considerados para a produção do documento.
O deputado Renato Roseno ressaltou que há muitos projetos de infraestrutura no Ceará, por exemplo, os complexos eólicos, que têm causado constrangimento às comunidades indígenas. Segundo ele, os protocolos tornam mais seguros os direitos dos indígenas para terem suas terras homologadas e demarcadas.
“É uma determinação de uma convenção internacional - a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) -, que o Brasil ratificou, determinando que quaisquer iniciativas que interfiram em uma terra indígena devem ser precedidas por consultas prévias, livres e informadas. O que lamentavelmente não é respeitado. Há séculos as terras indígenas estão sendo invadidas, exploradas, destruídas. Há uma lógica de extermínio que acompanha o processo de colonização no Brasil. Por isso, é tão importante afirmar o direito à consulta, mais do que isso, que a gente possa de fato torná-la uma prática real, em especial aqui no Ceará”, afirmou Roseno.
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Foto: Dário Gabriel
O cacique Luiz Marcos Tapuya-Kariri, disse que as questões indígenas são historicamente negligenciadas no Brasil e que os povos precisam ter sua cultura, tradições, linguagens e sabedoria respeitadas. Para ele, o protocolo é uma forma de o povo indígena ser escutado, antes de qualquer coisa impactar o seu território.
“São muitos ataques, alguns povos foram até extintos. Esse protocolo veio pra reformar nossa identidade ancestral. Esses complexos eólicos surgem como uma afronta e desrespeito ao nosso protocolo. Na nossa comunidade, um território sagrado está sendo violado. As torres do complexo eólico afetam diretamente um lugar sagrado. Não pensamos na terra só como chão batido. Para nós, não é isso. Nós não vendemos nossa mãe terra”, afirmou Luiz Marcos.
A orientadora de Defesa e Promoção dos Povos Indígenas da Secretaria dos Povos Indígenas do Estado do Ceará, Antônia Kanindé, disse que a instituição é um espaço de escuta e uma forma que o Governo do Estado buscou para conseguir um diálogo mais efetivo com o movimento indígena. A representante da Secretaria pontuou que existem esforços em andamento para que o Ceará deixe a lista de estados com menor número de territórios indígenas demarcados no País.
“Entendemos que o Governo do Estado tem planos audaciosos sobre inúmeros empreendimentos e o que queremos, enquanto Secretaria, é que os povos sejam ouvidos e consultados, antes de qualquer ação efetiva do Estado, junto ou nas proximidades de seus territórios. A Secretaria é também uma ponte, é um lugar de escuta e é construída também por pessoas indígenas, que conhecem e estão atentas a essa luta e a essa causa”, disse Antônia Kanindé.
Representantes dos povos Anacé, Tremembé e Tapeba também estiveram presentes na audiência pública e levaram suas preocupações, especialmente sobre as homologações de seus territórios e da preocupação com ameaças de invasão. O povo Anacé foi o primeiro do Ceará a ter um Protocolo de Consulta Prévia elaborado e, conforme o cacique Roberto Anacé, o documento ainda não é respeitado.
“Uma palavra que é muito dita atualmente é ‘equidade’ e não existe equidade em relação aos povos indígenas, porque não somos ouvidos. Se não houver reparação de fato para quem cuida da natureza, a questão climática vai ser sempre um negócio. O protocolo é vivo, não tem um ponto final. O que nos resta é esperar e saber se o Governo, a Funai vão respeitar ”, afirmou Roberto Anacé.
Thiago Anacé, coordenador da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) Nordeste II, disse que, em 2020, houve um entendimento em que a Funai foi muitas vezes colocada contra os indígenas. “Demarcar terra indígena vai na contramão do que o mercado quer. Negar o território, agrava mais ainda o direito dos povos indígenas. A Funai mudou recentemente de entendimento, por conta da força e da resistência dos indígenas, e recomendou, inclusive, que alguns empreendimentos se adequem aos protocolos de consulta dos povos indígenas”, afirmou.
Além das autoridades já citadas, estiveram presentes e compuseram a mesa da audiência pública Thiago Araújo, representando a Defensoria Pública da União; Adriana Tremembé, liderança do povo Tremembé da Barra do Mundaú; Magnólia Said, do Projeto Tucum; e Cecilia Paiva, do Escritório de Direitos Humanos e Assessoria Jurídica Popular Frei Tito de Alencar (EFTA).
Edição: Clara Guimarães
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