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Nove constituições são aprovadas pelo Parlamento em 190 anos da Alece

Por Juliana Melo
02/05/2025 12:14 | Atualizado há 11 horas

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- Arte: Publicidade Alece

Nos 190 anos da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece), fatos importantes marcam a história do Parlamento cearense, entre eles, a elaboração e aprovação de Constituições.  Lei fundamental de um país e estados,  a Constituição estabelece os princípios, direitos e deveres dos cidadãos, a organização dos poderes do Estado e as normas para o funcionamento das instituições. É o documento que fixa a base para a organização política e define a relação entre o governo e os cidadãos. 

Desde a sua instalação, até os dias de hoje, o parlamento cearense debateu e aprovou nove Constituições estaduais: 1891,1892, 1921, 1925, 1935, 1945, 1947, 1967 e 1989. Cada uma dessas cartas reflete a realidade e o momento politico em que estão inseridas, e as características que marcaram esses momentos da história do Estado. 

A primeira delas vem logo após o fim da Monarquia no Brasil, no  dia 15 de novembro de 1889,  e o início da República, período que trouxe grandes mudanças políticas, refletindo também nas províncias Brasil afora. O decreto nº 1, de 15 de novembro de 1889, assinado pelo Chefe do Governo Provisório, Marechal Deodoro da Fonseca, determinou que  cada um dos estados “decretará a sua Constituição definitiva, elegendo os seus corpos deliberantes e os seus governos locais”.

 Elaborada em 1891, a primeira Constituição Federal republicana incluiu o presidencialismo como a nova forma de governo e trouxe em seu texto as regras para a eleição do presidente e vice-presidente da República, com mandatos de quatro anos e sem reeleição para o período presidencial imediato. O texto estabeleceu ainda o Congresso Nacional composto por duas Casas: a Câmara dos Deputados e o Senado, com eleição para senadores e deputados ocorrendo simultaneamente em todo o País.

Segundo o historiador Carlos Pontes, do Memorial Deputado Pontes Neto (Malce) da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece), a primeira eleição para se formar o Poder Legislativo no Ceará se deu em 10 de fevereiro de 1891. Ele explica que “os 36 parlamentares cearenses teriam a incumbência de, nos meses após o pleito, elaborar a constituição inaugural do Estado, para, em seguida, dissolver-se a Assembleia Constituinte e passar a exercer, com a mesma composição, seus deveres de Poder Legislativo”.

Portanto, naquele ano foi instalado o Congresso Cearense Constituinte, que elegeu para governador do Estado do Ceará o general José Clarindo de Queiroz e, como vice, o major Benjamim Liberato Barroso. No mês seguinte, foi promulgada a primeira Constituição do Estado, aprovada por deputados e senadores cearenses, com uma característica que durou poucos anos: um sistema bicameral local, composto por 24 deputados e 12 senadores estaduais.

Carlos Pontes destaca que, em 16 de junho de 1891, foi promulgada a primeira Constituição Cearense. Ela teve uma breve duração: exatos um ano e 26 dias, refletindo a instabilidade institucional ainda existente por conta da nova ordem política. “Esta Constituição trazia em seu texto um profundo desejo de modernização do Estado do Ceará, motivando posteriores reformas políticas, institucionais e econômicas na qual a autonomia estadual foi legítima portadora do federalismo e da descentralização política, assegurados por intermédio de eleições e mandatos do Executivo e do Legislativo, renováveis a cada quatro anos", detalha o historiador.

Já no ano seguinte, em 1892, por conta de forte oposição aos deodoristas, o vice-governador, Liberato Barroso, assumiu o governo e, em 18 de fevereiro, dissolveu a nova Casa Legislativa cearense. Novas eleições foram convocadas, em abril do mesmo ano, para compor uma nova Assembleia Constituinte. 

O Congresso Cearense reiniciou seus trabalhos para discutir e elaborar uma nova Constituição para o Ceará, substituindo a proclamada no ano anterior. “Promulgou-se a Carta em 12 de junho de 1892, a qual não mais continha, no capítulo correspondente ao Poder Legislativo, o Senado Estadual, restando a Assembleia Legislativa composta exclusivamente de Deputados. Voltava a ser o Parlamento Cearense unicameral, como o fora no Império e como é até hoje”, pontua o historiador Carlos Pontes.

Essa não foi a única mudança da nova constituição. Surge na segunda Carta Magna do Ceará a gratuidade na instrução primária e do ensino elementar de artes e ofícios. O texto determina também, em seu artigo 137, que a Constituição de 1892 somente poderia ser modificada dois anos após sua promulgação e por deliberação de dois terços dos membros da Assembleia. A nova Carta Magna vigorou no estado por 29 anos.

NOVO SÉCULO E MUDANÇAS

Em 1921 é elaborada uma nova constituição estadual, a primeira do século XX, trazendo um olhar mais aprofundado para a administração pública, estabelecendo, entre suas principais mudanças, o Estatuto dos Funcionários Públicos do Ceará, a Lei Orgânica dos Municípios, a Lei de Organização Judiciária do Estado, entre outras.

Nessa Carta Magna surge a ideia da criação do Tribunal de Contas, a ser implementada posteriormente. Outro ponto de destaque foi a limitação de até 40% para a despesa com o funcionalismo municipal.

A Assembleia Legislativa era composta então por 30 deputados, que se reuniam em sessões anuais de dois meses e dedicavam-se à votação do Orçamento estadual, à criação de órgãos administrativos e à fiscalização das contas públicas.

A constituição seguinte chegou apenas quatro anos depois, em 1925, e trouxe inovação na parte relativa ao funcionalismo, tratando de forma mais detalhada sobre nomeações e aposentadorias, bem como de normas do Poder Judiciário e Ministério Público. 

Mas houve outra mudança, ainda mais significativa: a aprovação do voto secreto, que foi amplamente celebrado pela sociedade. No entanto, a novidade não incluía as mulheres, que só passaram a usufruir do direito ao voto em 1934, por meio da Constituição Federal. 

Em 1935, uma nova Carta Magna foi aprovada no Ceará. Nesses dez anos de intervalo, muitos episódios históricos foram determinantes para o País e para o Estado. A crise econômica de 1929 teve reflexos em todo o Brasil e somou-se a insatisfações sociais e políticas. 

Um golpe militar retirou o então presidente Washington Luís, dando início à Era Vargas, que durou de 1930 a 1945. Ao assumir a presidência, Getúlio Vargas fechou o Congresso Nacional e as assembleias legislativas estaduais. Também retirou governadores e os substituiu por interventores nomeados pelo presidente.

A nova constituição do Estado foi promulgada em setembro de 1935 e evidenciou a função fiscalizadora do Poder Legislativo em artigos que tratam sobre a convocação de secretários de Estado e de presidentes do Tribunal de Contas, a criação de comissões de inquérito ou mesmo propor ao governador a revogação dos atos das autoridades administrativas proferidos contra a lei. 

O documento inovou na Constituição Estadual destacando o dever do Estado de proteger a família e as classes menos favorecidas, garantir um padrão de vida compatível com a dignidade humana, desapropriação de latifúndios em benefício de pequenos agricultores ou cooperativas e previsão da criação de órgãos especiais para facilitar o acesso à Justiça gratuita pelos necessitados, entre outras medidas; além de títulos destinados a disciplinar questões tributárias, orçamentárias, regulamentação de serviços públicos.

ESTADO NOVO

Essa Carta Magna vigorou até novembro de 1937, quando foi implantado o Estado Novo, dissolvendo o Congresso Nacional e as assembleias legislativas estaduais. O País recebeu uma nova Constituição, outorgada por Getúlio Vargas, inspirada nos regimes fascistas europeus. Os estados perderam autonomia, passando a ser governados por interventores nomeados pelo presidente. 

As Assembleias Legislativas só reabriram quase uma década depois. Em 1945, em um contexto pós-segunda guerra mundial e fim do Estado Novo no Brasil. Segundo o historiador Carlos Pontes, a nova Constituição cearense refletia o desejo de restauração democrática. A Carta Magna cearense assegurou direitos individuais e políticos fundamentais, além de consagrar a separação dos poderes e a autonomia estadual. Além disso, a Constituição de 1945 delineou o sistema eleitoral e as responsabilidades dos órgãos estatais.

O documento traz características do Poder Legislativo estadual que estão presentes até hoje, tais como a elaboração das leis com a colaboração do governador do estado, composição da Casa por 45 deputados (hoje, são 46 deputados), eleitos mediante sistema de representação proporcional. Também trata do quórum para funcionamento da sessão, disciplina comportamentos dos deputados, remunerações e atribuições do Poder Legislativo estadual. 

Já em 1947, uma nova Carta Magna no Ceará foi inspirada na nova Constituição Federal, que foi aprovada no ano anterior, e influenciada pelo fluxo redemocratizante presente em todo o mundo.

Os 45 deputados estaduais trouxeram ao novo texto a preocupação com a transparência dos atos da administração pública. Foram estabelecidos ritos processuais para crimes cometidos por gestores, além do espaço para a sua ampla defesa. 

Também buscou disciplinar a criação de taxas e tributos, para evitar abusos na ação tributarista do Estado, tendo, inclusive, o cuidado de inserir um artigo que impede a incidência de imposto sobre pequenas propriedades rurais. Há ainda artigos que visavam a promoção do desenvolvimento econômico, estímulo e proteção às atividades no Estado.

OS REFLEXOS DA DITADURA 

Depois de vivenciar a busca pela redemocratização, mais uma vez, o Brasil volta a encarar um novo contexto político de governos autoritários, em consequência de um golpe de estado, em 1964.

Assim como a Constituição Federal, outorgada em 1967, uma nova Constituição do Ceará foi elaborada no mesmo ano, trazendo vários artigos que foram apenas adaptados da Carta Federal e trazido para o contexto do Estado. 

Um dos pontos de destaque é a sujeição do Ministério Público ao Poder Executivo. Além disso, o chefe do MP do Estado era escolhido e nomeado pelo governador, após a aprovação do nome pelos deputados estaduais. 

Outro aspecto importante está relacionado à segurança pública: a Polícia Militar passa a ser regida por lei federal, sendo organizada como uma força auxiliar do Exército, centralizando seu comando em nível nacional.

Instrumentos de soberania popular ficam quase inexistentes na Constituição Federal de 1967. O plebiscito, por exemplo, só poderia ser usado quando tratasse da criação de um novo município, e não para dar voz aos cidadãos sobre questões constitucionais ou de grande importância social. O referendo e a iniciativa popular só foram incluídos a partir da Constituição Federal de 1988.

Apesar do contexto da época, a Constituição do Ceará de 1967 trouxe algumas inovações no campo da educação, tais como a distribuição de investimentos na área baseado em critério geográfico e de acordo com a densidade demográfica; as despesas na área passaram a seguir uma proporcionalidade de acordo com os graus de ensino; prevê também estabilidade de funcionários concursados após dois anos.

As informações para essa matéria foram extraídas da coleção Constituições Cearenses, que traz os contextos históricos e os textos de todas as Constituições do Ceará. Esse rico acervo histórico foi elaborado pela Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece), por meio do Instituto de Estudos e Pesquisas sobre o Desenvolvimento do Estado do Ceará (Inesp), com o apoio da Universidade Estadual do Ceará (Uece) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Os livros estão disponíveis nos arquivos digitais do Inesp.

A Agência de Notícias da Alece também contou com o apoio do Memorial da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece), Deputado Pontes Neto (Malce), que desenvolve ações de preservação da história do parlamento do Ceará. Na próxima matéria do especial vamos detalhar a Constituinte de 1989 e os fatos que marcaram a feitura dessa carta e avanços na área da cidadania. 

Edição: Clara Guimarães/Lusiana Freire

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