Demandas de mulheres indígenas são acolhidas em audiência pública na Alece
Por Pedro Emmanuel Goes13/12/2023 18:16 | Atualizado há 4 dias
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Conhecer as dificuldades existentes para a elaboração de políticas públicas para a proteção de mulheres indígenas e a prevenção da violência contra esse público foi o principal objetivo da audiência pública promovida pela Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece) na tarde desta quarta-feira (13/12). Durante o encontro, a ausência de um mapeamento da violência contra mulheres indígenas, de uma rede de apoio e acolhimento que contemple essas mulheres e questões territoriais foram apontadas como principais gargalos no combate à violência.
O recorte étnico nos índices de violência contra a mulher é necessário para precisar de que forma as violações de direitos impactam as mulheres indígenas. Conforme a deputada Larissa Gaspar (PT), que propôs a discussão, políticas de prevenção e enfrentamento à violência específicas para mulheres indígenas só são possíveis a partir de um diagnóstico que contemple as causas dessa violência.
“Precisamos compreender o que acontece nas comunidades e nos territórios indígenas, especialmente porque a violência não se limita apenas aos centros urbanos. A partir disso é que podemos elaborar propostas efetivas e que garantam uma vida digna a essas mulheres”, explicou.
A ideia é que as demandas apuradas na audiência sejam estudadas e inspirem políticas específicas a serem apresentadas como propostas legislativas e pelas secretarias de governo.
A ausência de uma presença institucional dentro das comunidades indígenas foi um dos principais pontos ressaltados durante o debate. A coordenadora do Centro de Pesquisa e Assessoria - Esplar, Magnólia Said, destacou a importância da presença de uma Casa da Mulher Brasileira em todos os municípios cearenses, para reforçar a rede de apoio às mulheres, levando informação e orientação jurídica sobre os casos de violência.
A possibilidade de ampliação da Lei Diana Pitaguary, que prevê o debate sobre relações de gênero nas escolas indígenas do Estado, para todas as escolas da rede pública estadual também foi levantada por Magnólia. Para ela, a violência contra a mulher está se tornando uma “pandemia”, ocasionada pela combinação de fatores como o colonialismo, patriarcado, racismo e o capitalismo.
“São ideias que subjugam as mulheres e que são difundidas cotidianamente a partir do que consumimos, sejam nossas relações familiares, profissionais, políticas, seja até a forma como nossa condição, enquanto mulheres, é apresentada e difundida pelos meios de comunicação, por meio das novelas, músicas, noticiários etc”, disse, reforçando que esse lado mais complexo não pode ser perdido de vista.
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Foto: Máximo Moura
A defensora pública Jeritza Braga, representante do Núcleo de Enfrentamento à Violência contra a Mulher (Nuden) da Defensoria Pública do Estado, confirmou a existência de um “abismo” entre a rede de apoio existente e as mulheres indígenas. Ela informou que, em oito anos de atuação no órgão, nunca houve um atendimento a mulher indígena.
“Isso mostra o quanto as ações do poder público ainda estão distantes dessas mulheres, então o mais importante nesse momento, talvez, seja encontrar formas de viabilizar que a informação chegue até elas, fomentando uma rede de apoio que esteja a seu alcance”, apontou.
Uma rede de apoio e as políticas públicas que garantam uma proteção efetiva contra as violações de direitos de mulheres indígenas deve, no entanto, levar em conta suas especificidades. Conforme Kilvia Tapeba, da Associação de Mulheres Indígenas Tapeba, o patriarcado e a naturalização da violência doméstica devem ser combatidos nas aldeias, mas, para isso, é preciso que a informação chegue até essas mulheres. “Somos aprisionadas desde que nascemos ao nosso papel na comunidade, que é ser mãe, cuidar da casa, sem uma perspectiva de vida para além disso”, lamentou.
Ela também apontou outras questões, como as dificuldades em fazer denúncias; as perseguições após as denúncias (pelos maridos, lideranças masculinas ou outros); a falta de demarcação das terras indígenas, que torna os territórios muito vulneráveis aos empreendimentos vindos de fora; o desemprego e até as medidas protetivas e de segurança nos casos de violência.
Sobre os casos de violência, a orientadora da Célula de Defesa e Promoção dos Povos Indígenas da Secretaria dos Povos Indígenas, Antonia Kanindé, informou que a pasta assinou termo de cooperação com a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Estado viabilizando diálogo direto com a Superintendência de Pesquisa e Estratégia de Segurança Pública (Supesp). O objetivo, segundo ela, é “traçar estratégias de combate à violência contra a mulher nos territórios indígenas”.
A audiência seguiu com a apresentação de outras propostas pelos participantes e com a distribuição da cartilha “Ceará Terra Indígena: Um Olhar das Mulheres”, elaborada pelo Esplar e pela Associação para Desenvolvimento Local Co-Produzido (Adelco). Contou também com a participação de representantes da Secretaria das Mulheres do Estado, da Organização dos Professores Indígenas do Ceará, da Adelco, da Associação das Mulheres Indígenas do Ceará, do Movimento das Mulheres Anacé e de outros movimentos.
Edição: Clara Guimarães
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