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Conquistas e desafios da participação da mulher na política

Por Narla Lopes
14/03/2024 14:05 | Atualizado há 1 mês

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- Foto: Arquivo Alece; arte: Banco de Imagens/Núcleo de Publicidade da Alece

Ao longo de décadas, as mulheres têm percorrido uma trajetória marcada por importantes conquistas, mas também por grandes desafios. Em uma sociedade em que o machismo e o patriarcado ainda são comuns, elas frequentemente sofrem violência e falta de respeito ao buscar igualdade e reconhecimento. No Dia Internacional da Mulher, celebrado em 8 de março, é importante refletir sobre essa jornada.

Um marco crucial nessa luta foi a conquista do direito ao voto feminino no Brasil, em 1932. Inicialmente facultativo e obrigatório somente às funcionárias públicas, esse direito se expandiu com a Constituição de 1934, tornando-se obrigatório para todas as mulheres e equiparando-as aos homens tanto no direito de votar quanto no de serem eleitas. No entanto essa vitória não veio sem resistência. Muitos viam esse avanço não como um direito legítimo, mas como um mero capricho, minimizando a importância da participação feminina na esfera política.

Mulheres como Maria Lacerda de Moura e Bertha Lutz estão entre as ativistas que lideraram essa luta por igualdade política no Brasil. Apesar dos avanços alcançados, ainda há um contraste significativo na representação política: as mulheres, que compõem mais da metade da população brasileira (51,13%) e 53% do eleitorado, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), respectivamente, ainda ocupam menos de 18% dos cargos eletivos.

BAIXA REPRESENTATIVIDADE

Na última disputa eleitoral aqui no Ceará, onde elas também são maioria do eleitorado, representando 52,84% desse universo, foram eleitas nove deputadas estaduais e três federais, compondo 12 das 68 vagas disponíveis ‒ um percentual de representatividade de cerca de 17%. O número, apesar de ser o mais alto já registrado no Ceará para as bancadas legislativas, está distante de uma democracia verdadeiramente representativa. 

É o que destaca a deputada Marta Gonçalves (PL). “Temos a maior bancada feminina da história do Parlamento cearense, com a presença de nove deputadas estaduais ‒ um aumento de 80% comparado com a legislatura anterior. Mas, mesmo assim, representamos apenas 19,5% dos deputados estaduais. Como vemos, temos muito a avançar no sentido de termos uma maior representatividade feminina na política”, salienta. 

Conforme a parlamentar, as mulheres têm o direito e a capacidade de ocupar todos os espaços que desejarem. No entanto, para alcançar essa igualdade de oportunidades, é crucial que as políticas públicas se empenhem em reduzir todas as formas de discriminação e reconheçam e valorizem o trabalho realizado por elas.

“Além disso, é essencial garantir a igualdade de oportunidades nas decisões políticas, sociais e econômicas, bem como fortalecer políticas que beneficiem as mulheres em todos os níveis. Mulher na política é um desafio, mas ela pode contribuir com coragem, força, determinação e sensibilidade. Quando temos uma política mais abrangente e diversa, abraçamos a sociedade como um todo, com ainda mais carinho e humanidade”, destaca.

BUSCA PELA PARTICIPAÇÃO EQUITATIVA

A deputada Larissa Gaspar (PT) aponta que, embora o direito ao voto feminino seja reconhecido desde 1932, isso não se traduziu em uma participação política equitativa até hoje. “No Ceará, apenas 16,85% dos municípios são governados por mulheres, um índice até superior à média nacional, que é de 12%. Isso significa que ainda temos muito pelo que lutar, pois ainda somos minoria nos espaços de poder e tomada de decisão", enfatiza. 

Deputada Larissa Gaspar (PT) / Imagens: Odério Dias

A parlamentar acrescenta que, apesar dos avanços, a Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece) continua majoritariamente ocupada por homens, sem nunca ter ultrapassado os 20% de representação feminina. Para mudar esse cenário, assinala a importância do investimento na educação e do combate aos estereótipos de gênero. “É fundamental que meninas e meninos compreendam desde cedo que a política é um espaço aberto a todos, onde ambos têm o direito e a capacidade de participar ativamente”, pontua.

Compartilhando do mesmo pensamento, a deputada Juliana Lucena (PT) reconhece os avanços recentes, mas enfatiza que ainda não é o ideal. Ela ressalta a necessidade de “continuar promovendo a participação e o empoderamento das mulheres” para alcançar uma representação mais inclusiva. “Nossa luta no Parlamento é para isso”, sublinha.

Juliana aponta ainda como obstáculo a desigualdade de oportunidades, falta de redes de apoio e mentorias para mulheres políticas e desafios relacionados à conciliação entre vida política e familiar, devido às expectativas sociais tradicionais sobre o papel das mulheres na família.

Ela celebra ainda a sanção da Lei 18.447/2023, que incentiva a participação feminina no processo eleitoral. “Em 2023, o governador Elmano sancionou essa lei de minha autoria, que institui a Semana de Incentivo à Participação da Mulher no Processo Eleitoral. A capacitação política e liderança para mulheres também são uma missão que deve ser abraçada pelos partidos”, pontua. 

Integrante de uma família de políticos, a deputada Gabriella Aguiar (PSD) destaca que sempre teve o incentivo para ingressar nesses espaços de tomada de decisão, mas reconhece que essa realidade não é uma regra para todas as mulheres. 

“Posso me considerar uma privilegiada por ter exemplo na minha casa de estímulo para a participação feminina na política. Mas é fundamental que as nove deputadas estejam lado a lado, buscando defender os direitos das mulheres, e eu acredito que a melhor maneira de combater qualquer tipo de preconceito é mostrando que somos boas demais para sermos ignoradas", ressalta.

A parlamentar aponta que a violência contra os direitos políticos das mulheres, a falta de apoio dos partidos políticos, a violência política de gênero, comportamentos conservadores e a ideologia da desigualdade e da discriminação ainda dificultam a participação das mulheres na política. E sugere que, entre as várias medidas fundamentais para aumentar a inclusão delas nos espaços de decisão, a principal é superar a cultura patriarcal que ainda domina a sociedade. "Não é uma tarefa fácil, mas acredito que já fizemos grandes avanços”, conclui.

A deputada Luana Ribeiro (Cidadania) cita também barreiras como o machismo estrutural, a falta de financiamento adequado para campanhas eleitorais, a dupla jornada de trabalho e a falta de apoio partidário. 

Para garantir a presença feminina nas arenas políticas, ela propõe medidas como a implementação de cotas de gênero mais efetivas, o estabelecimento de políticas de financiamento transparentes e equitativas, a promoção de campanhas de conscientização sobre a importância da participação das mulheres na política e a criação de programas de capacitação e mentoria para encorajar e preparar mulheres para cargos públicos. 

“É imprescindível também o desenvolvimento de iniciativas que facilitem a conciliação entre vida profissional, familiar e política, como creches acessíveis e horários de trabalho flexíveis”, frisa.

Para a deputada Dra. Silvana (PL), apesar de ainda ser menor em quantidade, a presença feminina na política local e nacional é por demais qualificada. Para a parlamentar, homens e mulheres enfrentam as mesmas barreiras para ingressar na vida pública. 

“Eu entendo que muitas mulheres se fazem de vítima exatamente para não irem à luta. Quero paridade de armas para a luta. A mulher tem capacidade para o embate político e para a conquista do pódio. Os homens não são inimigos, são concorrentes tanto quanto as mulheres que estão no campo adversário”, destacou, acrescentando que cabe às mulheres abrirem caminho para o protagonismo feminino.

DESIGUALDADE NA POLÍTICA

A deputada Lia Gomes (PDT), por sua vez, salienta que o Brasil é um dos países mais desiguais da América do Sul quando se fala em participação das mulheres na política. “E aqui no nosso Estado não é diferente”, acentua, destacando que, no Ceará, nenhum percentual de mulheres eleitas chega a 20%, considerando prefeitas, vereadoras, deputadas estaduais e presidentes de câmaras.

“Existe uma lei que determina que os partidos empreguem 5% de mulheres para estimular e aumentar a nossa participação, mas não é respeitada. E quando as mulheres apresentam seus nomes, elas não conseguem um financiamento adequado. Os partidos têm, reiteradamente, burlado as leis de cotas. Esse é um fenômeno que acontece nas legendas de todos os lados”, lamenta.

A parlamentar observa que, embora o Brasil estabeleça uma cota de 30% para candidaturas femininas, países como a Bolívia, que já alcançaram quase 50% de representação feminina e atualmente contam com 46%, adotam cotas não apenas para candidatas, mas também para mulheres eleitas. “E aí, eles conseguem de maneira mais rápida essa igualdade”, acentua. Para ela, se o Brasil continuar no ritmo que está, vai demorar 130 anos para alcançar “essa tão sonhada igualdade”.

Para a deputada Jô Farias (PT), a sub-representação das mulheres na política persiste como um desafio. Em linha com suas colegas de Parlamento, ela destaca a necessidade de implementar cotas de gênero, programas de capacitação política e incentivos para a participação feminina em partidos e lideranças. Além disso, enfatiza a urgência de combater o assédio e a violência política de gênero. “Fomentar a diversidade e a igualdade de gênero é fundamental para fortalecer nossa democracia e garantir tomadas de decisão mais inclusivas para as mulheres”, pontua.

Deputada Emilia Pessoa (PSDB) / Imagens: Odério Dias

A deputada Emilia Pessoa (PSDB) também considera limitada a presença feminina nos espaços políticos. Para superar essa barreira, ela argumenta que é necessário ir além das cotas partidárias femininas garantidas por lei. “É preciso fomentar um movimento robusto que reconheça e valorize a capacidade social das mulheres, bem como ser protagonistas da mudança que tanto desejamos alcançar. Tudo começa por nós, mulheres simples, mas corajosas para lutar”, conclui. 

PROJETOS DELAS

A atual legislatura tem sido marcada por um esforço para ampliar os espaços de participação das mulheres e combate à violência de gênero. Até este mês de março, 82 projetos de lei foram propostos para fortalecer políticas femininas. Destes, 24 foram deliberados, cinco foram aprovados e três viraram lei. Seguem alguns deles:

PL 546/2023: apresentado pela deputada Juliana Lucena, institui a Semana de Incentivo à Participação da Mulher no Processo Eleitoral, a ser realizada anualmente na última semana do mês de março, no âmbito do estado do Ceará (Lei n.° 18.447).

PL 126/2023: proposto pelos deputados Nizo Costa e Jô Farias, torna obrigatória a divulgação de mensagens contra a violência feminina em eventos esportivos, promovendo a conscientização em ambientes de grande visibilidade ( Lei n.° 18.488).

PL 665/2023: iniciativa dos deputados Romeu Aldigueri, Guilherme Landim, Renato Roseno, Lia Gomes e Larissa Gaspar, estabelece a Política Estadual de Enfrentamento à Violência Política contra a Mulher ( Lei n.° 18.484). 

PL 250/2023: apresentado pela deputada Larissa Gaspar, define um percentual mínimo de participação feminina nos conselhos de administração das empresas públicas estaduais e outras entidades controladas pelo Estado, promovendo a igualdade de gênero em posições de liderança.

PL 411/2023: das deputadas Larissa Gaspar e Gabriella Aguiar, propõe a gratuidade temporária no transporte público intermunicipal para mulheres em situação de violência, oferecendo suporte essencial em momentos de vulnerabilidade.

Edição: Clara Guimarães

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